A história
O filme “A onda” tem uma referência factual que se reporta a acontecimentos verificados em 1967 numa escola secundária de Palo Alto, Califórnia (EUA). "The wave" (A onda) descreve a experiência pedagógica – de uma inusitada radicalidade – levada a cabo por um professor de História que propõe que se reproduzam, em contexto de sala de aula, as técnicas da propaganda fascista. Proclamando-se líder do movimento que denomina de "A onda", o professor exorta à disciplina e faz valer o poder do grupo sobre os indivíduos, recorrendo aos rituais e iconografia das formações totalitárias. Os estudantes obedecem cegamente. A escola inteira é envolvida no fanatismo apologético d’A onda, até que um casal de alunos mais consciente chama a atenção do professor para a perda do controle da experiência pedagógica que já passou para o domínio da realidade quotidiana da comunidade escolar.
Análise
Vivemos atualmente num tempo em que a manipulação das massas é vista é maior ou menor grau. Mas isso não é de hoje. Essa prática também não foi abolida com os regimes totalitários. Ela se faz presente nos nossos dias nos mais variados tipos de discursos, sejam eles midiáticos ou políticos. Diariamente somos expostos as mais diversas fontes e correntes ideológicas que nos tentam convencer de “suas verdades” seja para apoiar uma forma de atuar – e condenar outra; ou para apoiar uma idéia em detrimento de outra.
No ateremos agora em algumas partes importantes do filme para entendermos alguns conceitos estudados em sala de aula.
O filme nos remete a alguns pontos de reflexão como: (1) o nazi-fascismo como ideologia política totalitária; (2) a psicologia de massas e a servidão voluntária dos indivíduos a um líder, grupo ou causa mítica; (3) a propaganda política e ideológica [1] que são ingredientes idéias para a propagação de ideologias autoritárias.
A questão da ideologia é dos pontos mais marcantes no filme. E partindo de uma vaga definição de ideologia como sendo “um sistema de idéias e das representações que dominam o espírito de um homem ou de um grupo social” (Bulik, p.13) fica mais fácil nossa compreensão. No momento do filme em que o professor Reiner Wenger (Jünguer Vogel) dando aula sobre Autocracia aos seus alunos e pergunta se era possível criar uma nova ditadura dentro da Alemanha depois do Nazismo (e sendo o Nazismo uma ideologia política repudiada até pelos próprios alemães) isso suscitou nos alunos uma discussão que era impossível ou improvável que isso acontecesse de novo nos dias atuais. Mas durante o enredo o que era impossível se tornou possível para os alunos.
O filme nos mostra de forma alegórica como se deu o inicio de um regime totalitário e os seus rituais e alertar-nos sobre o perverso fascínio e poder doutrinário dos movimentos ideológicos políticos (...). O uso de slogans, palavras de ordem e a adoração de um suposto "grande líder" repetem-se na história da humanidade: aconteceu na Alemanha nazista, na Itália fascista, na Espanha Franquista, no Portugal do Estado Novo, mas também no chamado ‘socialismo real’ da União Soviética, principalmente no período estalinista, na China com a "revolução cultural" promovida por Mao Tsé Tung, na Argentina com Perón.(grifo meu)[2]
Remetendo-nos ao conceito de autocracia que literalmente significa a partir dos radicais gregos autos (por si próprio), cratos (governo), governo por si próprio. Aparentemente de forma bem sutil podemos perceber no filme que do ponto de vista ideológico as pessoas tendem a ser guiadas ou controladas para fazer aquilo que a mandam fazer. No caso particular dos personagens centrais do filme isso se torna bem presente. Apesar dos alunos serem aparentemente de classe média, com carros de luxo, uma vida ostentada por festas, eles facilmente se envolveram pelas idéias da organização, coletividade, irmandade e outros ideais totalitários impostos pelo professor.
No momento em que o sr. Wenger consegue incrustar essas ideologias na cabeça de seus alunos, começa então, o movimento da Onda que apesar do período da experiência pedagógica ser de uma semana, o movimento toma contornos reais na vida social e pessoal dos discentes. O que era apenas uma dinâmica torna-se um movimento autoritário liderado pelo professor que em vários momentos se deixou levar pela idéia do Poder que exercia sobre seus alunos e estes subordinados as suas ordens. E como bem sabemos,
O totalitarismo caracteriza-se pelo triunfo de uma ideologia sobre as outras. Ela se sobrepõe à força, vigiada por um poder discricionário, que a estende a todas as instituições e, através delas, a todas as esferas da sociedade. Não admite nenhuma oposição e promete acabar com ela. (Bulik,p.28).
Isso aconteceu no filme no momento em que Karo (Jennifer Ulrich), percebendo que seus colegas estavam levando a sério demais o movimento decide por não fazer parte e se isola. Mas esse isolamento somente se deu porque o grupo vendo que ela não aceitava as ordens do sr. Wenger decidem por excluí-la das atividades, isolando-a. Porém, ela não desiste de lutar contra o movimento. Outro momento que caracteriza o triunfo de uma ideologia sobre as outras é quando os alunos saem à noite pichando as paredes e decidem colocar sua marca por cima do símbolo do outro movimento neonazista o que mais tarde vai haver um confronto entre as duas correntes ideológicas.
Os alunos se entregaram totalmente as ideologias do autoritarismo de tal forma que uns passaram a viver aquelas ideologias. Foi o caso que Tim (Frederick Lau) que levou a sério o experimento ao aplicar esses conceitos em sua vida pessoal. Isso nos remete ao ponto da psicologia de massas e a servidão voluntária dos indivíduos a um líder, grupo ou causa mítica. Ele se entregou totalmente a ideologia que passou a ser um militante armado do movimento. E nos final do filme quando o professor decide acabar com o movimento sua vida perde o sentido porque as ideologias eram o sentido de sua existência, decide então tirar sua própria vida.
Quanto ao ponto da propaganda política e ideológica que mencionei no inicio do texto podemos perceber claramente quando os alunos decidem criar um slogan do movimento, a saudação e a propagação dos ideais do movimento. A forma de propaganda que usam são os adesivos, as pichações que durante uma noite os integrantes do movimento saem pelas ruas “distribuindo” seus panfletos.
O enredo do filme,
(...) mostra que existem dois lados da moeda chamada “autocracia”. Se em uma face do experimento de Rainer Wenger vemos a jovens se sentindo “poderosos” enquanto grupo unido em uma mesma “ideologia”, de outro contemplamos a exclusão sumária de qualquer forma de pensamento contrário. Não existe espaço para dúvidas ou para idéias diferentes daquela que a gestão autoritária do grupo dominante prega. Isso pode ser visto em sistemas autocratas mais óbvios, como o de uma ditadura, e até mesmo em formas “prioritárias” de pensamento em sociedades democráticas como a nossa – quem hoje em dia questiona o capitalismo, o livre consumo, o uso da internet em todos os cantos? [3]
Voltando-nos agora principalmente a questões dos meios de comunicação como propagadores de ideologias sabemos que a imprensa é um grande porta voz, os lideres autoritários se falem dos meios midiáticos para usá-lo com instrumento de poder uma vez que usam para seu próprio beneficio. E quando a imprensa não se submete aos ideais autoritários sofre a censura prévia, publicando somente aquilo que agrada ao governo vigente.
Por vezes pensamos que o autoritarismo não existe mais nos dias atuais. Que acabou ou não tem mais espaço na atualidade para esse tipo de regime. Mas nos enganamos, ele está mais presente do que imaginamos,
“ esse espírito permanece ainda hoje, por vezes disfarçado por um a fraseologia democrática. Em todos os lugares em que um governo age de modo autoritário, qualquer observador poderá encontrar algum controle autoritário sobre as comunicações públicas. Os veículos radiofônicos estão sempre de certa forma controlados, mesmo em sociedades democráticas. Na Inglaterra, Japão, Canadá e Austrália coexistem empresas radiofônicas públicas e privadas. Na grande maioria dos países, a rádio é monopólio do Estado, evidenciado-se, até, em alguns deles, uma relação autoritária com o governo - ex. França, Bélgica, Alemanha, Índia, Itália. O autoritarismo foi a filosofia mais dominante em relação à comunicação pública, quer em termos de tempo como em diversos países. [4]
O regime político autoritário caracteriza-se pela coexistência de esferas dominadas pela ideologia do Poder situacionista e das esferas livres ou oposicionistas, buscando, entretanto, controlá-las e reprimi-las, através dos aparelhos repressivos do Estado, tais como política, a justiça, as leis etc. Cede e ao mesmo tempo reprime as idéias, os projetos e os partidos da oposição. De fato, consente uma oposição permitida. Assim é, por exemplo, que tais regimes admitem liberdade de imprensa. Na pratica buscarão tolhê-las através de instrumentos especialmente criados para isso como sejam as leis especificas e a censura oficial. (Bulik,p.29).
O exemplo mais clássico é a Venezuela em que os meios de comunicação sofreram e ainda sobre a censura por parte do governo. O Irã recentemente censurou a imprensa quando não permitiu a divulgação da revolta popular da ultima eleição. Aqui mesmo no Brasil com o Estadão que foi proibido de publicar quaisquer assuntos relacionados à família Sarney.
Alguma referência pesquisada
BULIK, Linda. Doutrinas da informação no mundo de hoje. São Paulo: Edições Loyola,
1990.
[1] LIMA, Raymundo de. A onda e o irracionalismo dos grupos. Revista espaço acadêmico. nº 65, out. 2006. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/065/65lima.htm.Acesso em: 02/09/2010.
[2] As Ditaduras na Europa - A ONDA um filme para o 9º ano. Disponivel em:< http://sol.sapo.pt/blogs/olindagil/archive/2010/02/23/As-Ditaduras-na-Europa-_2D00_-_1C20_A-ONDA_1D20_-um-filme-para-o-9_BA00_-ano.aspx>. Acesso em: 10/09/2010.
[3] A Onda. Disponivel em : http://moviesense.wordpress.com/2009/02/25/die-welle-the-wave-a-onda/ acesso em: 02/09/2010.
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