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segunda-feira, 5 de julho de 2010

Postada no site da Agencia Fotec em 28 Maio 2010

Marcos Andruchak:

Da galeria aos muros da cidade


O artista e professor da UFRN fala sobre muralismo e explica seu projeto de extensão

Por Bárbara Oliveira, Cezar Barros e Leandro Willian

O professor Marcos Andruchak, vice-chefe do Departamento de Artes da UFRN, é artista plástico reconhecido internacionalmente. Transitando do muralismo ao design gráfico, Marcos é o mentor do projeto Andruchak Arte Brasil.

O projeto de extensão, coordenado pelo artista, consiste na pintura de murais em vários locais, tendo como foco a capital potiguar. Para realizar os trabalhos, o professor envolve alunos e pessoas da comunidade na pintura.

O artista faz uma reflexão sobre o dever de cada um em contribuir com a sociedade em que se vive, dando um pouco de si. Com uma visão moderna sobre política, o professor, que possui doutorado em Design Gráfico pela Escola de Comunicação e Artes da USP, conclama os cidadãos a adotarem posturas mais colaborativas com a sociedade.

Nessa conversa, Andruchak falou sobre a recepção da arte, o muralismo e o grafite, bem como sua relação com a universidade. Ele finalizou nos convidando para, junto com ele e seus colaboradores, pintar um mural na cidade.

A arte requer sensibilidade e pode ser concebida de modo racional. De que forma essa relação é trabalhada?

Normalmente, na primeira vez em que uma pintura é observada, o emotivo, o sentimental, é o que chama mais a atenção das pessoas – em razão das cores, das formas, do relevo, da profundidade ou das perspectivas. Esse é o primeiro momento da apreciação da obra. O segundo momento ocorre quando a pessoa destina um tempo a verificar os detalhes da obra. Nesse momento, a pessoa pode deixar de gostar daquela arte. Isso é que justifica a importância do conteúdo da obra.

Para apreciar uma obra é necessário algum conhecimento técnico/artístico?

De forma alguma. A obra pode ser apreciada por qualquer público, independente de sua classe social ou do seu conhecimento. Alguns artistas não se preocupam com isso. Particularmente, tenho essa preocupação. Quando crio uma obra, imagino que várias pessoas irão apreciá-la. A arte passa a ter dois tipos de significado, dois patamares: o primeiro se dá quando eu jogo a minha ideia e o segundo quando o público a captura. Dependendo do nível de conhecimento do público, de sua cultura e do seu envolvimento com a arte, ocorrem a percepção e a emoção suscitadas pela obra.

Existe diferença entre valor emotivo/sentimental e valor financeiro em uma obra de arte?

O diferencial acaba existindo com o tempo. Sempre que vou produzir uma obra, o cliente determina o tamanho. Quando produzo uma obra para exposição e trabalho nela durante muito tempo, começo a gostar daquela arte e percebo que valores muito mais fortes passam a existir. Em consequência, o preço aumenta. Tem algumas peças que eu gosto tanto, que não as vendo.

Como você vê o cenário artístico de Natal?

No Brasil e em Natal, a arte é um setor em expansão. O país é muito novo na arte. Só para ilustrar, na época do descobrimento, a Monalisa já havia sido pintada. O problema é que as pessoas não dão o devido valor. No ensino médio e infantil, por exemplo, costuma-se falar que a disciplina de Artes não reprova. Em Natal, isso também é muito forte. Aos poucos é possível incluir o RN no centro das artes no Brasil, plantando uma nova forma de pensar, mostrando que a arte é importante, assim como as demais disciplinas.

Hoje, podemos perceber um aumento acentuado de pinturas em muros e paredes na cidade. A sua chegada a Natal contribuiu para dar um upgrade nessa forma de expressão?

Eu tenho certeza disso. Quando eu cheguei aqui, esse trabalho não existia nas paredes. Quando comecei a fazer, me perguntavam o motivo de estar fazendo isso e, muitas vezes, de graça. Eu sempre respondia que todo brasileiro deveria doar-se um pouco para a sociedade. Dessa forma, queremos incentivar outros artistas a produzirem a sua arte, não apenas comercialmente. Antes, eu produzia a minha arte e ela não saía de perto de mim se não pagassem por ela. Hoje, penso novos valores. Passei a ver isso quando fui para fora do país. Lá, eles estendem o tapete vermelho para o artista. Eles nos tratam muito bem.

Como você definiria o seu estilo? Quais são as suas maiores influências?

No início, meu estilo era tumultuado. Sempre quis um estilo que me representasse sem que precisasse colocar meu nome. Primeiramente, era surreal. Nesse estilo, fiz um trabalho muito bonito. Um dia recebi um livro de artistas japoneses e vi que quase metade daquelas obras podia ser minha, porque parecia com o meu trabalho. Eu me enxergava ali. E isso me incomodou. Reneguei a tudo o que vinha fazendo. O que era perfeito, eu transformei em imperfeito. O que tinha profundidade, eu tornei raso. O que tinha contorno, descontornei. Depois dessa mudança, fiquei incomodado quando uma pessoa me perguntou se eu não conseguia fazer um contorno reto. Talvez essa pessoa não tenha entendido minha proposta. A partir daí, busquei um estilo próprio. Foi quando pensei no geometricismo e consegui criar esse meu estilo. Inspirei-me em muitos artistas como Pablo Picasso, Salvador Dali, Aldemir Martins e muitos outros, sempre buscando a minha individualidade.

Há alguma dificuldade para um muralista migrar para outro suporte, como telas, tecidos, papel, dentre outros?

O contrário é mais difícil. Quando se desenha um mural, necessita-se usar escalas maiores e assim é criada a habilidade com o trabalho em perspectiva. Quando se vê o trabalho pequeno, ele está de forma isométrica. No momento em que se vai fazer um desenho na parede, você olha de perto e não de longe. Se o artista não conseguir perceber essa peculiaridade, ele vai desenhar de forma distorcida. Aquele que desenha em mural tem maior facilidade para desenhar em tamanho reduzido.

O muralismo é bastante confundido com o grafite. O que diferencia essas duas formas de arte? Como trazer o muralismo e o grafite para dentro da academia?
O muralismo é diferente do grafite. O grafite é um trabalho que se iniciou nas ruas. As pessoas começaram treinando nos muros, pichando. Pouco a pouco, o grafite buscou fazer uma arte melhorada, chegando à expressão que tem hoje. Desde então, as pessoas o levaram para as galerias. Eu pensei o inverso. Queria levar um trabalho que já está na galeria para as ruas, proporcionando esse acesso às pessoas que não têm contato direto com a arte. Há várias formas de trazer o muralismo para dentro da universidade. Isso já se dá por meio da história da arte, das pinturas feitas pelos alunos e do estudo desse movimento. O projeto Andruchak Arte Brasil também é uma forma de trazer o muralismo para a universidade.

O muralismo mexicano é uma arte monumental e política, elaborada por artistas combativos, aberta ao público. Seus artistas queriam revalorizar a cultura pré-hispânica. Essas ideias foram expostas num manifesto redigido em 1921, pelo pintor David Alfero Siqueiro. Na sua arte, o que você quer imprimir?
Eu quero mostrar como o indivíduo pode contribuir para o seu país. Naquela época, Siqueiro já pensava nisso e o fez numa linha bastante crítica, por meio da sua visão política. Quando pintamos um mural em uma praça, contribuímos com a melhoria da visibilidade desse espaço público. O meu trabalho, apesar de não ter nenhum objetivo político, acaba tendo. O que é política? Política é organização. Quando eu proponho que cada um deva contribuir para a sociedade, isso já é um envolvimento político. Eu faço para que as outras pessoas também façam.

O projeto Andruchak Arte Brasil tem realizado vários murais pela cidade e alguns em outros estados e no interior. Sabemos que isso dá muito trabalho e que envolve a participação de alunos e pessoas da comunidade. Fale um pouco do processo da realização desses murais.

O Andruchak Arte Brasil é a menina dos meus olhos. Decidi criar um projeto de extensão que levasse o nosso conhecimento e integrasse os estudantes e as pessoas da comunidade. Para fazer um mural, definimos onde o faremos ou vamos para onde formos convidados. Esse mural vai ter um tema. E, dependendo desse tema e do tamanho, decidimos quantas pessoas podem participar. Chegamos ao local com o desenho já esboçado. Eu desenho na parede e indico as cores. O resto é deixar o pessoal participar. Depois disso, faço as devidas correções, de modo que a obra adquira as características que eu pretendia.

Quais os desafios enfrentados pelo projeto Andruchak Arte Brasil?

No início, as pessoas perguntavam o que eu estava querendo. Fui muito criticado. Os artistas achavam que eu estava com alguma ideia deturpada. Mas isso foi só inicio. Hoje, estou muito feliz com a proporção que o projeto vem atingindo. A receptividade existe e é muito gratificante.

E o reconhecimento dele na academia?

Quando estou na universidade, eu visto a camisa. E aqui, quando vejo uma parede, sinto a vontade de fazer um trabalho nela. Certo dia, vi uma parede e comecei a conversar na Escola de Ciência e Tecnologia sobre a possibilidade de fazer um mural. Um dos professores me falou que eu até poderia fazer, mas antes teria de falar com um professor do Departamento de Artes, que já tinha um projeto de extensão nesse sentido. E me mandou falar com o Andruchak. Eu achei muito interessante e me apresentei. Isso é legal. A minha imagem não é conhecida, mas o meu trabalho é.

Você deseja acrescentar alguma coisa?

Quero convidá-los para fazer um mural conosco. Vocês vão lá, pegam os pincéis e pintam como qualquer um de nós. Depois, quem sabe, vocês não fazem uma matéria sobre isso. Aliás, um dos objetivos é transpassar as fronteiras da pintura dos murais. Se forem, vão poder conhecer de perto o projeto e viver essa experiência.

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